quinta-feira, 30 de abril de 2009

Educação tradicional, ao estilo japonês


Kumiko Makihara* Em Tóquio (Japão)
Se o som viaja a 331 metros por segundo quando a temperatura é de 0ºC, e a velocidade aumenta 0,6 metro por segundo a cada grau de temperatura, qual é a distância entre uma pessoa e um raio se ela ouve o estrondo cinco segundos depois que vê o raio, a uma temperatura de 5 graus Celsius?

Fiquei furiosa porque meu filho, de nove anos, não consegue resolver esse problema por mais que tenhamos resolvidos questões parecidas juntos várias vezes. A prova de Ciências é amanhã, e se ele não for bem, provavelmente não conseguirá um A em seu boletim.

E qual o problema se Yataro não tirar um A em Ciências na quarta série? É difícil para mim refletir sobre essa pergunta simples à medida que me afogo nas tentativas de evitar que ele naufrague nas provas da semana: Ciências, Compreensão de Leitura e Poesia Antiga. Na semana que vem: identificar os 47 Estados e governos das cidades do Japão, uma demonstração de como pesar itens numa balança e uma corrida de 1,5 quilômetro.

A escola primária particular de Yataro está situada no extremo mais tradicional do debate que acontece no país sobre qual é o melhor tipo de abordagem para a educação: o caminho ortodoxo da memorização adotado por causa de uma competição feroz, ou o método mais completo que promove o pensamento criativo e independente.

Regurgitar fatos tem sido uma capacidade há muito tempo prezada pelas escolas japonesas por causa dos exames rigorosos para entrar nas universidades do país. Mas esse tipo de ensino unidimensional foi criticado por ser "tsumekomi", ou voltado para os exames. Desde os anos 80, o país reduziu o horário a carga horária e o currículo escolar sob o lema "yutori", ou flexível.

Na última década, entretanto, a classificação acadêmica dos alunos de escolas primárias e secundárias caiu em várias pesquisas internacionais, e cada vez mais o yutori está sendo responsabilizado por este declínio. O pêndulo está retornando para um aumento de currículos e carga horária.

A escola de Yataro tem um nível de cobrança alto. Ele foi reprovado no exame de memorização de diálogos em inglês porque não fez os gestos que acompanhavam as falas. Ele é um leitor voraz, mas fica aturdido com questões como: "divida o trecho em quatro cenas com base no tempo, lugar, personagem e sentimentos do personagem principal, e escreva os números na primeira linha de cada cena".

Há recompensas para os vencedores - alguns professores dão adesivos e brindes para quem vai bem nas provas - e nada, exceto talvez a humilhação, para o resto dos alunos. Depois da corrida de 1,5 quilômetro, as crianças foram posicionadas de acordo com sua classificação, enquanto o último colocado chegava cambaleante, acompanhado por um professor de bicicleta.

A consciência que Yataro tem de sua colocação fez com que sua autoestima diminuísse. "Este ano vou chegar em 25º lugar ou antes na maratona", escreveu recentemente no meu cartão de aniversário. Não era um sonhado terceiro lugar, ou mesmo o décimo, mas uma autocrítica bem considerada. Numa lista de autoavaliação que ele preencheu no ano passado sobre 26 tarefas escolares, ele não deu um "ótimo" a si mesmo em nenhuma delas, nem mesmo na que ele havia tirado nota máxima, que
dizia: "Fui para a escola todos os dias em boa saúde".

Os pais também entram na disputa, torcendo para que seus filhos sejam melhores que os outros e ficando orgulhosos de seus sucessos. Quando os boletins foram entregues no ano passado, uma menina disse que a mãe instruiu-a a descobrir o máximo que pudesse sobre as notas dos colegas sem que revelasse muito sobre as suas próprias.

Eu senti uma alegria muito grande quando Yataro ficou em segundo lugar de sua classe numa prova de Ciências, não só porque nossas exaustivas sessões de estudo haviam sido recompensadas, mas porque a mãe do menino que ficou em primeiro lugar era uma cientista. Senti-me uma mãe vencedora, derrotada apenas por uma cientista que tinha uma vantagem injusta sobre os demais.

É difícil cultivar um amor pelo aprendizado num ambiente como esse.
Logo que Yataro chega da escola, pergunta "o que tenho que fazer hoje?" enquanto eu arranco sua mochila para encontrar a prova mais recente ou as folhas de dever de casa antes de nos sentarmos à mesa da sala de jantar entre pilhas de livros escolares.

Recentemente aconteceu um dos eventos escolares mais competitivos do
ano: o torneio anual de queimada, em que as quatro salas da mesma série competem entre si.

"Jogue nela!", gritou uma mãe ao meu lado enquanto as crianças atiravam a bola umas nas outras. A classe do meu filho teve uma grande virada, saindo do último lugar no ano passado para vencer o cobiçado título. A lição de casa naquele dia era uma composição sobre a partida; mínimo de duas páginas e meia e que provavelmente seria distribuída para todos os pais. E por um breve período, Yataro pode se rejubilar com a glória.

"Pela primeira vez em quatro anos", escreveu, "fiquei em primeiro".

* Kumiko Makihara é jornalista free-lance.

Tradução: Eloise De Vylder
Tags: contemporaneidade, educação

Compartilhar

Nenhum comentário: